Criminalizar discurso do ódio não fere a Constituição
O debate sobre o discurso do ódio, caracterizado por qualquer atitude, conduta ou expressão que incite a violência ou discriminação contra um grupo de pessoas, tem crescido no Brasil. Atualmente, as discussões giram em torno do Projeto de Lei 122/06, que prevê a criminalização da homofobia. A polêmica está no fato de que uma corrente de pensadores entende que a criminalização do preconceito, por orientação sexual, ofende a liberdade de expressão e de manifestação de pensamento. Mas a proibição do discurso do ódio não fere, de forma alguma, este princípio constitucional.
No Brasil, a Constituição define a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. O artigo 5º, inciso XLI, diz que "a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais". O inciso XLII proíbe expressamente toda forma de racismo — "XLII – a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei". E, por outro lado, a Carta prevê a garantia da liberdade de expressão e de manifestação pensamento. E isso não é só em razão de o Brasil ser um Estado Democrático de Direito, mas também em virtude do pluralismo político.
O Projeto de Lei 122 criminaliza qualquer forma de discriminação por orientação sexual — seja de heterossexuais, bissexuais ou homossexuais. Atualmente, a Lei 7.716/89 já proíbe a conduta de "praticar, induzir ou incitar, pelos meios de comunicação social ou por publicação de qualquer natureza, a discriminação ou preconceito de raça, por religião, etnia ou procedência nacional.
No Brasil, após a apresentação do referido projeto de lei, aumentou o debate sobre o discurso do ódio. A maioria dos países de regime democrático entende que a proibição do discurso do ódio não fere o princípio da liberdade de expressão ou manifestação de pensamento, com exceção dos Estados Unidos. Na Alemanha, existe lei que prevê a punição de quem insulta ou difama segmentos da população. No Canadá, também há lei que criminaliza o ato de quem intencionalmente promove o ódio. Em Portugal, são punidas todas as formas de discriminação e discurso do ódio.
Embora exista o projeto de lei, no Brasil ainda são lentos os passos para a punição desse tipo de crime específico, notadamente quando se trata de orientação sexual. Em nome da argumentação moral, pessoas dos diversos segmentos da sociedade defendem seus pontos de vista levando em consideração o meio social em que vivem. Uns são a favor da garantia do direito da liberdade de orientação sexual. Outros, contra. Ou seja, é conveniente defender uma ideia que está em consonância com o meio social que o individuo vive e convive, seja igreja, escola, grupos comunitários e outros. E, neste ponto, vale lembrar que o filósofo Hutcheson defende que a aprovação e a condenação são as ideias próprias da moral que as temos apenas quando contemplamos os motivos ou as ações na medida em que estas são motivadas.
Sem entrar no mérito de qual é o melhor caminho, até mesmo porque cada um tem seus próprios argumentos, é preciso debater a questão do ponto de vista ético. A ética não pode estar refletida no que pensamos que seja certo de acordo com nossa conivência social, religiosa ou ideal de felicidade. Fazer o que é certo depende de outros fatores que vão além dos argumentos defendidos socialmente. E, sob este ponto de vista, não é correto simplesmente segregar um grupo de pessoas por sua orientação sexual ser diversa do que se chama de convencional. Por isso, conclui-se que a liberdade de expressão e a livre manifestação de pensamento são totalmente compatíveis com a proibição do discurso do ódio.